sábado, 16 de janeiro de 2010

Eu Era Cega e Não Sabia!



Naquele hospital, conheci a dor... Casei não muito jovem, corria o risco de ficar pra ‘titia’. Assim sendo, podemos dizer que, Heitor me amava com mais intensidade, mais verdade... O casamento foi lindo..., emocionante. Desses, que, ficam gravados na nossa mente. Casada há poucos anos e, sem filhos; um esposo dedicado, amoroso e fiel... Sim! Fiel! Existe fidelidade no matrimônio, e, graças a Deus por isso. Na Sua infinita misericórdia, Ele sabia que eu precisaria de um marido que me amasse o bastante, para não desejar ninguém mais além de mim... Eu, filha única, mimada, cheia de vontades... Ele, filho único, muito amado pelos pais e família, porém, de pé-no-chão, teve que trabalhar cedo, aprendeu várias línguas, por trabalhar em hotelaria. Eu o sugava com meus caprichos e falta de conhecimento de Deus. Pouco a pouco fui o induzindo a visitar cada vez menos a família – eu o queria só para mim –, pouquíssimas eram às visitas que fazíamos a família do Heitor... Na minha frivolidade, eu o traía... A música é um dom, cantar, louvar, também o é! Está na igreja, não é estar em Cristo! E, dentro da casa do Senhor, eu fui infiel ao meu Senhor e ao meu esposo.
Heitor, apaixonado, não conseguia me enxergar como de fato eu era... O meu temperamento autoritário, e, muitas vezes arrogante, não conseguia mudar em Heitor a tamanha paixão e amor que ele sentia por mim. A certeza de sua fidelidade, estranhamente fazia com que eu por vezes lhe ferisse, chegando a ser até mesmo cruel... Porém, ele jamais me contrariava..., de repente comecei a perder peso, a cansar facilmente, até o momento, em que se fez preciso, consultar médicos... O céu enegreceu, turvou-se..., recebi o diagnóstico que mudaria toda a nossa vida: ‘Leocemia!’ Passamos por momentos muito difíceis e por um longo tratamento: ‘poliquimioterapia agressiva’. Fiquei osso e pele e os tratamentos com laser, me deixaram cega. Em momento algum, Heitor me abandonou ou deixou de declarar o seu amor, mesmo em lágrimas... Uma das vezes, em desespero, a chorar convulsivamente, por me achar feia, sem cabelos – eu os tinha perdido através dos medicamentos e quimioterapia – mesmo assim, ele dizia: você é linda! Será sempre o meu amor!
Certa vez, enfraquecida, debilitada e cega, no leito de um hospital, dependente de todos e estando às mãos de enfermeiras – nem sempre Heitor podia estar presente –, conheci os bastidores de um hospital e a dureza dos que se formam em ‘enfermagem’ visando tão-somente o salário, sem nenhuma vocação e/ou amor...
Heitor me presenteou com um pequeno som, e, com amor o colocou a minha cabeceira, para que eu pudesse ouvir música, louvores... Que falta eu sentia da igreja e dos cultos, até mesmo dos irmãos que eu passava de largo, sem lhes dar importância. Aliás, eu não dava quase que valor a muitos deles... Deus estava tratando comigo. A doença; o me sentir nada e sem esperanças de vida; sentir-me rejeitada; a repulsa de quem eu julgava me amar; o afastamento dos que me cercavam, como que, abelhas ao mel... Levou-me a procura sincera de Deus! Eu já aprendera a chorar manso... A lembrar da família de Heitor, que eu queria distante!...
Naquele momento, eu estava saudosa a ouvir lindos hinos, que faziam a minh’alma sentir leveza... Entraram duas enfermeiras, e, uma delas, ironicamente falou: Hum... Está ouvindo música, é? Mas, essa é muito lenta! Vou colocar outra!
– Não mude Márcia...! Ela está ouvindo hinos... Deixe-a em paz!
– Ah! Não! Vai ouvir o que eu quero!
E colocou o som em um barulhento ritmo... Às lágrimas desceram-me silenciosas... Perdi a visão, não a língua! Porém, Deus o Mestre estava ‘moldando o barro’, segundo a Sua vontade. O mais impressionante é que nada eu disse a Heitor. Eu sabia que ele tinha o ‘pavio curto’, levaria o caso à direção do hospital, acarretaria em muitos outros problemas... e, eu estaria, bem no centro deles! Não! Eu precisava estar bem com Deus! Ele é Deus de milagres!
Tudo passou e o hospital transformou-se em meu apartamento... Durante um sono agitado, me debatendo em agonia no leito, tombei! Cai e bati a cabeça pesadamente no chão... Heitor tinha descido para falar com o médico e ao voltar... Lá, estava eu, com uma poça de sangue sob a cabeça, desacordada! Gritos! Clamor... Heitor caiu de joelhos ao meu lado, médico e enfermeiras chegaram, procuraram o meu pulso... em vão! Eu estava morta!

Enquanto isso, senti uma sensação de leveza... um grande conforto, algo indescritível...Olhei para baixo e me vi deitada ao chão, Heitor e pessoas ao redor, peguei em mim, tudo era tão diferente! De repente, não mais eu estava ali, porém, em um lugar resplandecente..., com um grande portão, imenso portão... Dois anjos ao lado de cada extremidade, sorriam para mim, enquanto o iam abrindo..., acenavam convidando-me a entrar... Eu curiosa, olhava para além do portão, enquanto este se abria. Uma grande multidão se achava ali, como que na expectativa da minha chegada... Não havia nenhuma lembrança de Heitor, dos parentes, ou de qualquer outra coisa ou pessoa... Tudo era novo, calmo, sereno, reluzente... Há poucos passos da entrada, vi os anjos, fecharem os portões, e, através de gestos dizerem: ‘Ainda não é tempo!’ Senti alguém apertar o meu corpo... E ouvi um grande clamor feito por Heitor, o esposo que aprendi a amar verdadeiramente, o presente mais caro que Deus me deu!
Graças a Deus! Louvo-Te Senhor!
Chorando, Heitor agradecia a Deus por minha milagrosa volta.

Dez anos se passaram, refiz todos os exames, recebi alta, estou curada!
Deus inverteu a situação. Eu tinha visão perfeita, porém, era cega espiritualmente; hoje sou cega, porém, posso ver Deus! Voltando ao hospital para exames preventivos, deparei-me com enfermeiras que me assistiram durante a enfermidade. Entre elas... A do som! E com falsa gentileza, em meio a todos, falou-me: – Ela não sabe o meu nome, não me reconhece... Não é querida? – Engano seu, Márcia! A sua voz ficou gravada em mim! Jamais lhe esquecerei... E, saiba: Deus Também...! Ele não esqueceu de mim...


Nota: Este conto é o resumo de um relato verdadeiro, apenas os nomes, sofreram alteração

EstherRogessi. Escritora UBE.Mat.3963.Conto:Eu Era Cega e Não Sabia!08/01/10.
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Baronesa da Gothia Rogessi de A. Mendes (EstherRogessi). Pernambucana, outorgada com Título Nobiliárquico - Alta Insígnia BARONESA DA GOTHIA da Augustíssima e Soberana Casa Real e Imperial dos Godos de Oriente, DAMA COMENDADORA da Real Ordem dos Cavaleiros e Damas Rei Ramiro de Leão. Comendadora pelo CONINTER ARTES.. Escritora UBE/SP; Embaixadora da Paz (FEBACLA); Artista plástica, Membro Correspondente de várias Academias de Letras e Artes Nacionais e Internacionais. Consulesa e Comendadora. Tem escritos publicados em Antologias e Revistas Virtuais, no Brasil e exterior. Publicou o seu primeiro livro solo, pela Editora Literarte intitulado "Conflitos de uma alma" Romance ISBN 978-8-5835200-8-5 EstherRogessi recebeu várias premiações nacionais e internacionais.